Opinião

Solstício de Inverno num país distópico!

Uma crónica de Isabel de Almeida

Começo por fazer um reparo inicial, por uma questão de rigor e justiça, Portugal é um país distópico, tem as suas idiossincrasias negativas também elas muito lusas, mas em boa verdade é o planeta que está, todo ele, distópico, aqui no rectângulo que nos coube em sorte somos apenas um pequeno grão de areia na engrenagem global.

 Estamos a entrar em pleno Solstício de Inverno, se o próprio Natal nunca é universal, por diferença de credos, e mais ainda porque há sempre quem não tenha onde se recolher, não tenha o que comer, nem tenha acesso aos bens essenciais e ao suprimento de necessidades básicas de vida inerentes à dignidade da vida humana, então este ano ninguém tem mesmo razões para, verdadeiramente, celebrar o Natal naquela que vem sendo a essência e o espírito deste período festivo.

Estamos então em pleno Solstício de Inverno, não consigo encontrar nada a que se possa chamar verdadeiramente Natal, a não ser o habitual consumismo que está bem presente, e que nos leva a presenciar filas intermináveis junto das grandes superfícies comerciais e nas lojas de marcas com produtos e preços mais ou menos acessíveis às bolsas (sorte a daqueles que ainda têm a felicidade de ter “bolsa”) dos Portugueses.

Somos e estamos um país triste, que tenta esconder as suas muitas fragilidades atrás das luzes da ribalta, as luzes estão nos programas de entretenimento destinados às massas populares que passam durante horas seguidas nas nossas televisões, fórmulas esgotadas, replicadas há longos anos sem mudanças de roteiro onde apenas se vislumbram pequenos raios de luz na divulgação de locais e tradições antigas da nossa terra e das nossas gentes mas cujo pendor cultural é rapidamente ofuscado pela rotineira repetição de espectáculos em playback, dos sorteios  de prémios através das chamadas de valor acrescentado.

As luzes estão nas galas de reality shows que não se ficam pela descoberta de novos talentos musicais (ainda assim, os mais positivos dentro da panóplia de oferta televisiva disponível)  mas que passam por programas (que já tiveram a sua época na historia dos media) que vivem da exploração da ignorância, falta de valores e exposição pública das fragilidades e misérias de jovens que sonham em ascender ao estrelato fácil, e quiçá almejam vir a constituir a próxima geração de apresentadores deste tipo de programas. Verdadeiras telenovelas da vida real que mostram, muitas vezes, o que de pior existe em tantos seres humanos. Estes mesmos programas alimentam toda uma rede de media (em formatos digitais ou impressos) que divulga intrigas, segredos, e não-notícias de toda uma rede destas fábricas de celebridades nascidas à pressa numa feira das vaidades que demonstra bem o tipo de sociedade que estamos a construir e, mais grave, deixa bem patente a sociedade que não estamos a conseguir construir, fazendo pensar seriamente naquilo que o futuro nos pode reservar…e não é bom pensar muito!

Bem sei que a cultura popular tem o seu lugar de pleno direito na sociedade, mas uma programação verdadeiramente democrática das nossas televisões devia contemplar várias formas de cultura, e incentivar também a cultura clássica, só que fazer pensar  criticamente e formar novas “cabeças pensantes” pode não ser bem visto por todos, em especial nestes tempos conturbados!

O país mascarado de Pai Natal também não consegue esconder autoridades de saúde que insistem em não saber comunicar, caindo no ridículo com efeitos contraproducentes, é surreal assistir às declarações do Dr. Rui Portugal (nem o apelido infelizmente escapa à ironia cruel do que nos é dado assistir) Subdirector-Geral da Saúde, nada correu bem naquelas declarações, nem o conteúdo, nem o tom em que foram proferidas, e com o devido respeito, ficarão para a história pelos motivos errados, porque mais parecem um excerto de um sketch dos humoristas britânicos Monty Python. Trocar compotas caseiras nos quintais ou nos vãos de escada…enfim!

Mas temos fragilidades bem mais graves a preocupar-nos além da tragicomédia da comunicação da DGS. Os crimes continuam a aumentar, a vida humana está cada vez mais destituída do seu valor intrínseco de bem supremo e valioso, a empatia está pelas ruas da amargura e mesmo aos olhos do mundo, num país que se orgulha(va) de ter um turismo de excelência o que podemos pensar dos factos sucedidos que envolvem a morte suspeita de um cidadão estrangeiro às mãos de uma equipa do SEF (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras), e o que pensar da proposta de ser colocado um botão de pânico nas instalações aeroportuárias onde se situem instalações sob a alçada do SEF? A ideia do botão de pânico, por si só, apresenta desde logo duas incongruências: a simples consideração da sua necessidade diz muito sobre a falta da confiança das chefias e da tutela quanto à actuação dos seus operacionais neste tipo de funções e, nesta senda das incongruências, se há de facto motivos para suspeitar e para prevenir, em que moldes um cidadão estrangeiro poderia aceder a um botão de pânico a partir do momento em que entre em áreas de acesso reservado sob a alçada do SEF? E porque se remete a um perturbante silêncio o Senhor Presidente da República? E como se demora cerca de nove meses a promover a demissão de chefias?

Como Portuguesa lamento dizer que não sinto orgulho do meu país, fazendo minhas as palavras da Socióloga Maria Filomena Mónica que também não se revê neste “Estado da Nação”.

Para concluir as reflexões desta semana resta-me deixar a todos os leitores os meus votos de um Solstício de Inverno (outrora Natal) em paz, com muita saúde ou em franca recuperação!


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