Opinião

Reguengos é filho de Santo Tirso

As conclusões do relatório da Ordem dos Médicos acerca do que se passou no lar de Reguengos de Monsaraz, onde morreram 18 pessoas levaria, em qualquer país decente, pelo menos à demissão da ministra da Saúde.

A auditoria é clara, a maioria dos utentes não morreram devido à infecção de Covid-19, mas por descompensação das suas doenças crónicas, muitos chegaram mesmo desidratados ao Hospital, ou seja, morreram de sede.

De acordo com o relatório final, o lar tinha falta de funcionários e não dispunha de um quadro clínico em número suficiente, os doentes infectados não foram isolados a tempo, não havia ninguém capaz de explicar aos médicos no Hospital qual era a medicação habitual dos idosos.

Não estamos a falar de um lar ilegal, mas de uma instituição aparentemente habilitada a ter idosos ao seu cuidado, que supostamente estaria devidamente licenciada. Se é possível idosos morrerem de sede em lares legalizados, a pergunta que sobra é, então o que se estará a passar nos outros e o que já se terá passado, mesmo antes da actual pandemia?

Vivemos tempos estranhos. Enquanto os problemas realmente importantes são tratados como coisas menores, enquanto a morte de pessoas à sede não desperta a sociedade civil da sua apatia, perguntamo-nos o que despertará então?

Tivemos a resposta nas últimas semanas. Em Santo Tirso, um incêndio que chegou a um refúgio ilegal de animais, levou à morte de dezenas de cães e gatos. Durante dias tivemos directos das televisões no local, dezenas de pessoas dirigiram-se ao abrigo e levaram animais para casa, pessoas anónimas foram ameaçadas de morte apenas por serem fisicamente parecidas com as mulheres que geriam o refúgio, dirigentes do PAN exigiram, e pelos vistos conseguiram que o bem-estar dos animais de companhia, deixa-se de estar na alçada da Direcção- Geral Alimentação e Veterinária e passasse para a tutela do Ministério do Ambiente. Deixamos que os brutos tomem conta de tudo, e impávidos e serenos aguardamos que os que causaram o problema, tenham agora a clarividência para o resolver.

Enquanto idosos morriam de sede em Reguengos, políticos em Lisboa aproveitaram de forma abjecta a morte de um negro em Moscavide, uns para saírem à rua e dizerem que Portugal é estruturalmente racista, outros para negarem os primeiros, infelizmente ninguém saiu à rua para pedir justiça pelos que morreram naquele lar em Reguengos. Os falsos problemas tomaram conta da cena mediática, ninguém se questiona como é possível que idosos morram à sede em Portugal, mas de repente somos todos especialistas em racismo e bem-estar animal.

Este é o tempo de hierarquizar prioridades, e não o peço aos políticos, porque aparentemente estes já não o conseguem fazer, preocupados que estão com as próximas sondagens, este é o tempo das pessoas comuns. Não podemos continuar a ignorar o que se passa nos lares, mesmo os legais, que condenam idosos a passarem os seus últimos anos de vida em profunda decadência e não podemos ignorar o que se passou nas escolas, que estando encerradas a maior parte do ano lectivo, condenaram uma geração de alunos.

Uma sociedade evoluída preocupa-se com os animais, mas sabe que o bem-estar dos velhos e das crianças é mais importante, e nós nem aí estamos e é pena.


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