OpiniãoPolítica

O sebastianismo económico

Desde de 1578, Portugal vive com o peso do sebastianismo, a necessidade de escolher um salvador da pátria, um cavaleiro andante que solucione todos os problemas do povo, aquilo que na cultura judaico-cristã chamamos de “Messias”.

Quase 500 anos depois, o nevoeiro mantem-se, mas hoje o nosso D. Sebastião tem características um pouco diferentes.

Da neblina esperamos um herói político, um super-homem da economia e finanças, com uma visão estratégica sobrenatural, capaz de resolver todos os problemas da sociedade portuguesa.

Ora, a nossa lista de pretendentes a “D. Sebastião” é longa. São várias as personalidades, dos dois principais quadrantes políticos, que se esfumaram, lentamente, pelo nevoeiro político, especialmente no período pós-crise financeira.

O mais recente candidato é António Costa Silva, engenheiro de minas e CEO da Partex (empresa petrolífera vendida pela Gulbenkian em 2019), o novo responsável pelo planeamento da retoma económica portuguesa, o “Consultor”.

António Costa Silva nunca teve experiência política/governativa – o que poderá ter aspetos positivos – mas, salvo melhor opinião, não se conhece trabalho na área da gestão de fundos públicos, nem parece ser um expert em matéria de fundos europeus.

Na sua apresentação à comunicação social, o novo consultor do governo expôs argumentos que seduzem qualquer sebastianista. É rápido, ao dizer que planeou a retoma da economia portuguesa em 3 dias e é barato, visto ter afirmado que não vai ser remunerado pelo cargo.

Não ponho em causa a sua competência como gestor de empresas, mas em matérias de grande interesse nacional pede-se profissionalismo, coordenação e tempo.

No desenho de um plano não basta pensar, é necessário pesquisar, estudar e debater, especialmente num tema com extrema importância nacional, que influencia a vida de milhões de portuguesas fragilizados pela crise. É, no mínimo, imprudente fazer recair num só homem os planos de Portugal a médio e longo prazo.

Não estará na hora de alterar o paradigma? Vale a pena continuar a confiar o planeamento estratégico em figuras individuais, que mudam de legislatura em legislatura? E para quando conjugar os planos económicos de medio e longo, com planos de restruturação estabilização no plano fiscal e judicial, criando as fundações necessárias para o desenvolvimento social e económico sustentado.

Para isso, Portugal não precisa de um D. Sebastião político/económico, precisa de instituições fortes e independentes, que articulem os contributos das várias áreas da sociedade, de forma a estabelecer alguma imunidade à arbitrariedade político-partidárias.

O atual governo pode estar a perder a oportunidade de reforçar e aproveitar os recursos já existentes na sociedade, nomeadamente: universidades (que contam com reputação internacional), observatórios económicos, fóruns, associações profissionais e até o próprio Gabinete de Estratégia e Estudos do Ministério da Economia.

Aliás, com a introdução deste novo nº 10 do planeamento estratégico e económico, o próprio Ministério da Economia fica desprovido de tática, sentido e confiança para o resto do mandato. O Ministério da Economia, com esta nomeação e com a amplitude dos seus objetivos, é uma instituição esvaziada por um consultor, relegando para segundo plano os muitos funcionários públicos que dedicam horas de trabalho ao planeamento e progresso económico.

Enquanto não aprendermos a valorizar e reforçar as nossas melhores instituições, repito universidades, observatórios económicos, associações profissionais, corremos o risco de cometer os erros do passado, desperdiçando, novamente, as ferramentas europeias para uma profunda restruturação da economia e da sociedade portuguesa.


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