Opinião

Máscaras Sociais!

Nunca, como nestes tempos de pandemia, a palavra máscara esteve tão banalizada e tão enraizada no nosso dia a dia. É certo que também as máscaras enquanto meios de protecção individual afectam necessariamente a forma como comunicamos com o mundo, e o modo como os outros seres humanos nos devolvem melhor ou pior o resultado dessa comunicação.

Podemos concluir que as máscaras criam uma barreira à expressividade da face geralmente considerada e vedam o acesso às expressões e micro-expressões que todos nós fazemos enquanto articulamos a fala através da expressão vocal por via do discurso.

Nos tribunais este vector do uso de máscara dificulta seriamente os rituais próprios da justiça, em esforço respiratório extremo temos de projectar a voz ainda mais alta para nos fazermos ouvir e são certas as dificuldades da escuta activa de outros actores no palco processual e procedimental da justiça. Importa também reconhecer que estes meios de protecção individual, porque são barreiras ao som e à expressão humanas acabam por enviesar certamente muitas apreciações e percepções daquilo que os outros expressam podendo, em última análise, levar a uma limitação na apreciação da prova por exemplo em termos de depoimento das próprias partes em litígio, ou das testemunhas.

Acredito que, como infelizmente o conceito de “novo (a)normal” ao que parece veio para ficar, teremos de encontrar formas de nos adaptar a todas estas mudanças e, quiçá, sistemas alternativos de comunicação. Por exemplo, pessoalmente, acho mais espontânea e credível a escuta e visionamento mesmo em vídeo em directo de alguém que presta declarações sem máscara, do que alguém que esteja na minha presença física a falar com a máscara colocada, mas as opiniões e entendimentos divergem, e muita tinta ainda irá correr em termos de legislação regulamentos e recomendações no campo da justiça.  Da minha parte, reconheço ser uma acérrima defensora dos meios audiovisuais de comunicação à distância em tempo real, e creio que serão um futuro a considerar seriamente até como forma de prevenir o contágio pelo novo corona vírus.

Mas as considerações supra expostas são apenas um dos muitos ângulos sob os quais pode ser analisada e perspectivada a terminologia “máscara social”. Se atentarmos nos contextos de áreas de saber como a psicologia e a sociologia, e outras ciências sociais complementares, resulta claro que, inseridos nas respectivas sociedades onde vivem, os seres humanos assumem mais ou menos voluntariamente um papel social que podemos apelidar de “máscara social” numa ironia assumida quanto às máscaras sociais agora tão em voga em tempos pandémicos.

E, de forma simples, o que podemos entender por máscara social, é um conceito equiparado ao papel social. Cada indivíduo surge como actor que assume em sociedade determinadas condutas, que se rege por determinadas normas e conjuntos de valores e princípios, por influência também social e familiar que o levam a assumir e a publicamente dar de si uma determinada imagem pública, ou seja, uma máscara.

E a máscara social pode esconder efectivamente o que não queremos mostrar ao mundo, deixando visível só a parte que entendemos ser “politicamente correcta”. Ora, assumindo que estamos numa atitude reflexiva e de auto-análise, deixemos de lado o cinismo e hipocrisia do politicamente correcto e reconheça-se de uma vez por todas que todos nós já cedemos, em algum momento, ao politicamente correcto, ao não podermos expressar publicamente a forma como encaramos determinadas situações apenas porque “iria parecer mal”, ou “o que pensariam de mim os outros?!” – Quem nunca?

Inadvertidamente, sempre que filtramos as nossas opiniões, a nossa atitude, a nossa postura perante contextos diversos estamos a encarnar um papel social …estamos a usar uma máscara social que, na nossa visão, é a mais adequada ao nosso estatuto, profissão, formação académica, estrato económico, meio onde residimos ou onde nos movemos.

A comunicação social está cheia de exemplos de máscaras sociais, ajuda a criar algumas delas, fomenta e alimenta outras porque estas são convenientes aos seus interesses económicos ou mesmo políticos, e tem o poder de construir ou destruir indivíduos socialmente relevantes.

A propósito de recentes acontecimentos que vieram a público esta semana, e sobre os quais não entrarei em detalhes pois não me parece que eu tenha legitimidade, conhecimentos ou que esteja no timing adequado para tal direi apenas que, entre os apoiantes de cada uma das facções, ou dos termos da equação mediática gerada podemos encontrar vários exemplos práticos que apontam no sentido das reflexões que acima explanei, mas uma coisa é certa, tudo é relativo, e no campo das possibilidades e até na matemática das probabilidades não é um dado papel social que dá ou retira razão a qualquer uma das pessoas envolvidas. Aguardemos o decurso das averiguações e investigações em curso, mas até prova em contrário ninguém é dono de verdades absolutas.

Todavia, não deixará de merecer a nossa aturada reflexão o seguinte: para o bem e para o mal os media conseguem, com forte exposição, influenciar a opinião pública, e a cobertura mediática de temas sensíveis deveria fazer apelar às boas práticas deontológicas do jornalismo nacional, pois há danos irreparáveis que podem ser causados à imagem das pessoas. Antes de sermos as personagens A, B ou C de um qualquer drama humano somos todos seres humanos com essência própria, com defeitos e virtudes e com famílias que podem pagar caro estigmas a que não deram azo.

Cuidado com o uso inadequado de máscaras sociais!


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