País

Lisboa de todas as cores. A Marcha do Orgulho LGBTI+ saiu hoje à rua

Um dia depois de se assinalarem os 50 anos da chamada Revolução de Stonewall, em que a polícia invadiu um bar em Nova Iorque para prender a maioria dos clientes homossexuais, as ruas de Lisboa voltam a encher-se de cor a partir das 17h00 desta tarde, com a 20ª Marcha do Orgulho LGBTI.

Historicamente, as Marchas do chamado Orgulho LGBTI (sigla que define pessoas lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e intersexo) recordam a conquista de algumas vitórias para esta população.

A ILGA Portugal diz que a Marcha quer homenagear “a coragem de todas as pessoas que lutaram”, reivindicando “o que falta cumprir”.

“O Amor Vence”

No Jardim do Príncipe Real, está tudo a postos para o início da Marcha, que vai atravessar a Rua D. Pedro V, a Rua da Misericórdia e a Rua do Alecrim, terminando no Jardim da Ribeira das Naus.

Sílvio e Daniel namoram há quase dois anos e vão juntar-se à Marcha pela segunda vez. “Fomos no ano passado e gostámos muito do espírito. Este ano não quisemos faltar”, diz Sílvio, um ativista pelos direitos das pessoas LGBTI.

Daniel, mais reservado, não se considera propriamente ativista e diz que vai mais pelo namorado do que por ele. “Nunca me revi nestas manifestações, embora sempre as tenha apoiado. Mas como ele [Sílvio] gosta de participar, venho com ele”.

Ao contrário dos outros anos, a ILGA Portugal não distribuiu balões com hélio por questões ambientais.

Sílvio e Daniel preferiam os balões, porque “eram mais visíveis”, mas levam um cartaz colorido com a frase “Love Wins” (O Amor Vence). Daniel diz que até conhecer Sílvio não acreditava muito nesta frase. “Com amor, vencemos todos”, diz Daniel.

Ângela e Diana conhecem-se desde a faculdade. Têm 28 anos e namoram há seis. São do distrito de Aveiro e estão de passagem por Lisboa para participar na Marcha deste sábado. “Tem sido uma aventura”, diz Diana por entre gargalhadas. “Fala-se muito em gays, paneleiros e outros nomes ‘fofos’, mas o mais giro que já nos chamaram foi de ‘fressureiras’. Nem sabia que essa palavra existia…”, diz divertidamente.

“Agora mais a sério, há a ideia que o amor entre mulheres é mais facilmente aceite. Nós achamos que não é bem assim”, diz Ângela. Frases vindas principalmente de homens, como “Que desperdício”, “Podemos fazer festa a três?” não costumam ser tidas em boa conta por este casal.

“Desperdício era estarmos sozinhas. Juntas, aproveitamo-nos bem uma da outra! Sem desperdícios nem cenas a três ou a quatro…”, diz Diana.

Intersexo: um conceito pouco esclarecido

O termo ‘intersexo’ é o termo usado para designar condições em que uma pessoa nasce com uma anatomia sexual e reprodutiva que não se integra na definição típica de sexo feminino ou masculino.

Por exemplo, a pessoa pode nascer com um testículo e ter grandes lábios, ou nascer com útero e um pénis mais ou menos desenvolvido. É uma condição diferente de o hermafroditismo, em que se nasce com os órgãos sexuais definidos de ambos os sexos.

“Queremos uma verdadeira autonomia corporal para as pessoas intersexo. Alertamos ainda para o desconhecimento social, a ausência do tema na educação e a forma como este é muitas vezes deturpado pelos meios de comunicação social”, refere o manifesto publicado pela organização.

Na Marcha, além de reivindicações, também há a celebração das conquistas já adquiridas. Em Portugal, das principais conquistas de direitos destacam-se a aprovação do casamento civil em 2010, a adoção e apadrinhamento em 2015, a Procriação Medicamente Assistida em 2017 e a autodeterminação da identidade/expressão de género e proteção das características sexuais em 2018.

Da Saúde à Educação

De acordo com a ILGA Portugal, estas lutas são necessárias essencialmente pelo que falta cumprir. Num manifesto publicado a propósito da Marcha de 2019, são denunciadas várias “injustiças”, como a contínua “patologização das pessoas transexuais”.

“A linguagem médica é ultrapassada, focada na dicotomia homem/mulher e ignora as necessidades das pessoas trans e não binárias [pessoas cuja identidade de género não é nem inteiramente masculina, nem inteiramente feminina]”, lê-se no texto.

Ainda no âmbito da saúde, é referida a “dificuldade de acesso à Profilaxia Pré-Exposição (PrEP)”, nomeadamente para casais sorodiscordantes, em que um dos membros é infetado pelo VIH e o outro é saudável.

Outra lacuna que é apresentada a nível da saúde continua a ser a discriminação nas dádivas de sangue e a “falta de formação de profissionais de saúde para atender da melhor forma” as necessidades dos utentes transexuais e intersexo no âmbito da saúde reprodutiva, sexual e mental.

Para Rosa Monteiro, secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade, a educação é considerado o primeiro pilar no combate à desigualdade e discriminação.

Segundo a governante, está já em curso a “elaboração de um guia orientador” para as escolas, sendo este um sector com “necessidade de urgência na intervenção”.

As associações que representam as pessoas LGBTI vão poder contar com um reforço financeiro por parte do Governo para uma formação mais eficaz nas várias esferas da vida social, precisamente nas áreas da educação, da saúde, nas empresas e em todo o espaço público e familiar.

De olhos postos no futuro

Os discursos de ódio e o conservadorismo das políticas nacionalistas e de extrema-direita preocupam os ativistas que lutam pelos atuais e futuros direitos LGBTI. “Esta corrente [conservadora e de extrema-direita] tem reagido à visibilidade que temos obtido à custa de muitas vidas perdidas, de muita dedicação e sem esperar nada em troca mais que o direito a uma vida digna e livre”, diz a ILGA em comunicado.

Sílvio e Daniel não pensam em casar, mas gostavam de ter um filho. Por vontade de Sílvio, “dois ou três”. Daniel discorda, mas diz, a brincar, que não quer “começar uma discussão” e beija o namorado.

Já Ângela e Diana, apesar de namorarem há mais tempo, não pensam nem em casamento nem em filhos. “Para já, estamos bem assim. Mas quem sabe um dia”, dizem.

As famílias de ambos os casais aceitaram bem estas relações. Mas nem todos os casais e famílias LGBTI têm essa sorte. É por elas que a organização da Marcha diz que estes eventos vão continuar a ser importantes.

“Há histórias individuais e coletivas de pessoas que foram perseguidas, marginalizadas, torturadas e assassinadas. Marchamos por todas elas. Marchamos porque existimos. Marchamos porque o nosso género são os Direitos Humanos”.


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