Opinião

Depois dos fogos de artifício chega a penitência!

Uma crónica de Isabel de Almeida.

Após um período festivo, que não tendo sido exactamente igual ao da era pré-Covid, ainda assim sempre nos concedeu a inadvertida ilusão de que podia haver alguma paz e mudança imediata para melhor, eis-nos chegados ao momento do duro regresso à realidade, naquele que será mesmo o primeiro banho frio do ano, metaforicamente falando.

Pois bem, quando começávamos a respirar com algum alívio, e ainda não destituídos na esperança dos efeitos da vacina no combate à pandemia, já sobre nós, qual nuvem negra, paira nova ameaça, uma nova estirpe mais contagiosa do Sars-Cov2 que tendo sido detectada em Inglaterra, prontamente se dispôs, com afã democrático e pese embora o Brexit, a viajar pela Europa, estando já presente em Portugal quer no Arquipélago da Madeira, quer já em território Continental. Não querendo ser um arauto da desgraça, e pedindo encarecidamente a vossa paciência para pouparem a mensageira, quer-me parecer que estamos prestes a mudar a designação do vírus, mas temo que os efeitos possam continuar a aumentar e que sejam ainda mais nefastos.

Assumamos a verdade, neste momento o resultado do jogo pela vida é: humanidade 0 – Covid 2!

O ano que amanhã verdadeiramente inicia na sua vertente de dia útil e normal de trabalho acabou de nascer e já contém em si o peso do medo e de novas ansiedades.  

Avizinha-se o momento do regresso ao trabalho, às aulas presenciais (com excepções fundamentadas em Mangualde – Viseu – , sendo expectável que as aulas decorram em formato não presencial em Pinhel e Mêda – Guarda, aguardando-se a confirmação das Autoridades de Saúde) e à imensa mole humana nos transportes públicos, isto tudo depois de um confinamento alargado a todo o território nacional, cumprido com maior ou menor rigor, e após um recolher obrigatório que, ainda gostaria que me explicassem mais uma excepção sem motivos , não esteve presente no arquipélago da Madeira eis que estamos prestes a aferir, talvez da pior forma, quais serão os resultados das festas, das filas intermináveis nas grandes superfícies comerciais (“como se não houvesse amanhã” diremos com ironia, mas a verdade é que, pelo andar da carruagem, e por nova e perversa ironia, ainda podemos concluir que quem prevaricou mas se divertiu é que ficou em vantagem, pois pode mesmo “não haver amanhã” em muitos casos).

De Estado de Emergência em Estado de Emergência, com medidas musculadas e duras que depois são furadas pelas excepções dos que têm a categoria de “ser mais iguais do que os outros” à boa maneira Orwelliana, assim vamos caminhando na incerteza dos dias, enfrentando o mundo lá fora com receio.

Ao nível local, em muitas comunidades pequenas começa a surgir um fenómeno expectável: os vizinhos espantam-se e revoltam-se perante casos de pessoas infectadas ou que deveriam estar em isolamento profilático que não cumprem as normas e se fazem passear pelos espaços públicos, também acompanhados de menores (que deveriam também estar sujeitos às mesmas pedidas de contenção); a extrema ansiedade leva mesmo ao surgimento de falsas acusações a pretexto da também recorrente partilha nas redes sociais de memórias de festas de outros tempos, não sendo rara surgirem trocas de insultos. Ou seja, socialmente já vamos no campo da delação, questionemos cada um de nós qual a forma de resolver este dilema intrincado: teremos nós cidadãos a legitimidade para “sermos policias uns dos outros” e por outro lado, quem conscientemente e sabendo dos riscos coloca a comunidade em risco tem legitimidade para tal?

Passamos mesmo da era dos fogos de artifício para a penitência de aprender a viver neste mundo que não reconhecemos como o nosso.

Já agora, e a propósito de fogos de artifício, pessoalmente sou crítica de todas as autarquias que optaram por investir neste evento, tanto mais que havia recolher obrigatório sendo que também não vislumbro razões para festejar o que quer que seja, seria de toda a justiça realocar os recursos financeiros gastos no fogo de artifício em iniciativas que melhorassem as condições de vida e saúde das populações locais.

Entretanto, aproximam-se as eleições eleitorais, e pode ser que até lá eu consiga arranjar espaço mental para as analisar, mas confesso que esta semana não estou nesse mood, em termos políticos não estou nada entusiasmada, e se comigo estiver em sintonia grande parte do eleitorado, isso é mau sinal!

De assinalar também que na justiça se assistem, finalmente, a momento em que a máscara do “está tudo bem”, “conseguimos trabalhar razoavelmente pese embora a pandemia”, “o sistema judicial funciona” começa a ceder e as fragilidades surgem à luz do dia da forma mais eficaz que conheço para quem sabe ser promovida uma mudança positiva sob o olhar e crivo atentos da opinião pública. A Senhora Ministra da Justiça, que tem por mote não ouvir nunca directamente as razões e queixas de quem “se queixa” irá ao Parlamento fazer-se ouvir e defender o indefensável, estou muito curiosa para saber como se irá justificar a valorização forçada em termos curriculares do Senhor Procurador José Guerra para efeitos de vir a desempenhar funções junto da União Europeia.

Não estou menos curiosa para saber o desfecho da mais recente demanda judicial que afecta a nossa Magistratura, e desde já parabenizo os dois magistrados que não temeram intentar uma providência cautelar por se sentirem injustiçados face aos critérios de seriação inerentes ao concurso para presidência das Três Comarcas de Lisboa. O Supremo Tribunal de Justiça viu-se na contingência de suspender a tomada de posse e todo o procedimento aguarda suspenso a decisão final em termos judiciais! Aguardemos pois para saber se haverá fogo de artifício ou penitência…

E após a época dos fogos de artifício, que são belos mas efémeros, é hora de afinar a paciência para enfrentar o mundo real, desconfinado e perigoso da jornada de trabalho. Que não nos falte a paciência nem a resiliência, essenciais nestes tempos!


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