Opinião

Democracia…em queda livre?

Uma crónica de Isabel de Almeida

Poderão alguns entender que estou a exagerar, todavia, talvez exista quem comigo concorde quando suspeito seriamente que a nossa democracia, titulada pelo Estado de Direito Democrático consagrado na Constituição da República Portuguesa já conheceu melhores dias, e já esteve bem melhor de saúde.

Naturalmente que a pandemia de Covid -19 é o mote geral para nos sentirmos em risco permanente, em constante insegurança e incerteza quanto ao nosso futuro e ao futuro dos mais jovens, mas parece-me que o vírus vem servindo de pretexto, desculpa ou oportunidade para toda uma série de abusos, aproveitamentos e, porque não assumir, oportunismos de circunstância, tudo condicionando a nossa existência.

Para este estado geral pré-caótico, ou mesmo já de caos instalado em diversos contextos, contribuem não apenas uma mas diversas variáveis, de ordem científica, económica, política ou social, e tenho de reconhecer que muita imprensa tem dado um forte contributo para alimentar esta cultura e ditadura do medo! Se duvidam façam a seguinte experiência de forma consciente e premeditada: deixem-se invadir pelos diversos formatos de imprensa, com especial relevância para os sempre poderosos meios audiovisuais durante pelo menos três dias consecutivos. Vejam noticiários em várias estações televisivas, assistam a debates e comentários de especialistas transmitidos pelos media mainstream e anotem o vosso estado de espírito de crescente medo, ansiedade e incerteza perante o futuro. Depois, numa segunda fase, experimentem passar três a quatro dias sem ver televisão, sem ouvir rádio, preferencialmente em bloqueio ou detox de acesso aos media, anotem as impressões, comparem com a primeira fase da experiência e retirem as vossas conclusões.

Pois bem, porque me parece que a democracia está em queda livre? Podia escrever um livro inteiro, mas vou tentar resumir neste espaço de opinião. Os nossos serviços públicos essenciais mostram perturbações de funcionamento que, salvo o devido respeito, não são todas devidas a uma maior alocação de recursos a determinadas tarefas específicas. Alias, pensemos em repartições públicas como registos e notariado, finanças, municípios e outras autarquias e até tribunais: se existe condicionamento e se se opta por menor contacto possível com o público, então seria forçoso concluir que o atendimento à distância deveria ser mais eficaz, de melhor qualidade, mais rápido e produtivo, pois nem sempre assim acontece, obrigações e prazos apertados e tempo de resposta apenas existem para os particulares e perdoem o desabafo, para os Advogados e Solicitadores, pois estou em crer que os procuradores ilícitos (agências de documentação, algumas funerárias, algumas agências imobiliárias) continuam certamente a ter tratamento preferencial e diferenciado…

A saúde é um escândalo, muito gostaria de entender porque motivo os centros de saúde, com a redução de consultas presenciais, e limites de acesso presencial aos respectivos espaços não conseguem, ainda assim agilizar os serviços prestados, atender telefonemas e resolver questões como a emissão de receituários online, podendo até coordenar e articular esforços com associações e colectividades locais e com as autarquias. Note-se que, sempre que nos limitam ou retiram direitos estão a beliscar a democracia na sua essência.

A educação é um campo onde se assistem às maiores atrocidades impunemente. Há uma tal panóplia de possibilidades de interpretações à medida das recomendações da DGS para o inicio e funcionamento do ano lectivo nas nossas escolas que  começa a ser recorrente assistir a pais e crianças em ansiedade e até angústia e medo, tais são as atrocidades cometidas que violam os mais basilares direitos das crianças, só para citar alguns exemplos: crianças obrigadas a praticar desporto de máscara; crianças retida durante horas seguidas dentro de salas, sem autorização para sair e o inverso, quando não têm aulas são muitas vezes forçadas a abandonar as instalações escolares mesmo que ainda tenham aulas a seguir, ficando na rua se não tiverem como retornar a casa durante esses hiatos de tempo; aulas onde se alimenta o medo e paranoia ao invés de serem ali leccionados os programas escolares; alunos proibidos de tocarem nos livros dos professores devido ao risco de contágio; crianças encerradas em áreas restritas no espaço escolar sem liberdade de circulação pela escola ao ar livre, uso de pulseiras de cores para diferenciar as áreas onde os alunos podem circular.

Sou favorável a um regime de excepção no qual os pais possam, sob termo de responsabilidade, decidir que os filhos não devem comparecer presencialmente na escola, e entendo que o ensino à distância não devia ser uma excepção mas uma das modalidades passíveis de livre e consciente escolha. Que geração de crianças e jovens estamos a criar, condicionada pelo medo, pela apatia emocional e pela não expressão de afectos? Como vai decorrer a socialização destas crianças? Como podem desenvolver empatia se estão proibidas de expressar afectos? São tempos onde praticamente podemos dizer que “amar é proibido” é isto que queremos para o futuro?

Redes de transportes onde não existem condições para cumprir minimamente o distanciamento social, e que constituem um sério risco de foco de contágio, o que é incongruente com o extremismo e fundamentalismo que depois encontramos noutros contextos, como os serviços públicos e o seu acesso selectivo e altamente condicionado quando é certo que a economia não se pode dar ao luxo de confinar, sob pena de definhar em definitivo, quiçá…

E os números? É inegável que o vírus mesmo invisível anda por ai entre nós, insidioso e pronto a atacar a todo o momento, mas perante seiscentas ou mais infecções diárias por corona vírus já pararam para perguntar quantos casos de outras patologias foram detactados? E quantos ficaram por diagnosticar e vão, a medio e longo prazo, causar a morte a quem as ostente e não possa diagnosticar. E todas as consultas, cirurgias e diagnósticos que foram adiados? Que custos terá este foco de todos os recursos da saúde apenas numa patologia que, sendo grave, não é a única com potencial mortífero?

Caro leitor, pense e responda: sente-se livre?


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