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Comerciantes da raia contam os dias à espera da abertura da fronteira em Chaves

No passado, aldeias que atualmente pertencem ao concelho de Chaves, no distrito de Vila Real, como Soutelinho da Raia, Vilarelho de Raia e Lamadarcos, estavam divididas pela fronteira e eram, por isso, portuguesas e espanholas. Os chamados ‘povos promíscuos’ acabaram com o tratado de Lisboa, em 1864, e as localidades passaram a ser apenas portuguesas.

Atualmente, e desde 2008, as localidades de Chaves e Verín, na Galiza, Espanha, separadas por 28 quilómetros, formam uma eurocidade, um projeto de cooperação transfronteiriço que envolve a partilha de um cartão de cidadão que dá acesso a piscinas, bibliotecas, eventos, formações ou concursos, bem uma agenda cultural e mais recentemente transportes.

Desde 16 de março que quer as tradições seculares, quer o projeto mais recente da eurocidade, que unem os povos transfronteiriços, estão suspensos com o fecho das fronteiras devido à pandemia de covid-19.

“Para nós, esta medida foi muito complicada, porque aqui não nos sentimos espanhóis ou portugueses. Estes são povos amigos, com aldeias dos dois países, e quando há um fogo em Portugal vamos lá ajudar e ao contrário também acontece”, resume a galega Puri Regueiro.

A proprietária de um supermercado e talho em Feces de Abaixo, localizado mesmo junto à fronteira, notou e muito a “falta de afluência dos portugueses”, que procuram o estabelecimento por compras variadas, gás, ração para animais e até o fumeiro produzido pelo talho.

Puri Regueiro, que da sua loja vê as autoridades espanholas a controlarem diariamente a fronteira desde março, conta os dias para que chegue o dia 01 de julho, data em que o encerramento de fronteiras termina.

Não muito longe, e também ainda com a fronteira à vista, o supermercado “Tony” também aguarda pelo regresso dos clientes portugueses.

Mais expressivo, o comerciante galego que deu o seu nome ao supermercado adianta que 90% do negócio é feito com portugueses.

Três meses e meio depois, Tony, além de esperar a reabertura das fronteiras, aguarda os clientes e que estes venham “com respeito pelo ‘bicho’ [novo coronavírus]”.

Com montras repletas de chocolates variados e outros produtos como o presunto ibérico ‘pata negra’, que atraem os portugueses junto da fronteira, Tony conta que este “é já um ano perdido” onde espera ainda recuperar “alguma coisa” até dezembro.

Já a caminho de Verín, mas ainda em Feces de Abaixo, está instalado um posto de abastecimento de combustíveis que também sofreu com o encerramento das fronteiras.

“Era pequeno e lembro-me que a passagem não era livre, mas era totalmente diferente, pois as pessoas vinham”, recorda Juan Feijó.

Com 80% de quebras nas vendas durante os últimos três meses, o proprietário aguarda agora o regresso dos clientes habituais: os portugueses.

Aquele posto é, de resto, um exemplo da não existência de fronteiras, pois emprega até mais portugueses que espanhóis, acrescenta Feijó.

No lado português, a cidade de Chaves vai recuperando a normalidade, com a reabertura das termas ou a chegada de turistas nacionais, mas os comerciantes sentem falta dos vizinhos espanhóis da Galiza, presença assídua pelos estabelecimentos de comércio e gastronomia.

“Estão a fazer falta os espanhóis. Somos uma cidade de fronteira e todos os negócios precisam deles para sobreviverem e viverem”, explica o empresário de Chaves Rui Machado.

Proprietário de vários negócios, entre eles os Armazéns Europa, Rui Machado lembra que é diária a visita de clientes do país vizinho.

“Vêm à procura de têxteis, acima de tudo, ou de objetos para o lar, e também vêm pela simpatia e atendimento”, aponta, acrescentando que, com o aproximar da data, há já clientes a ligar, a perguntar se o armazém está aberto e se a partir de 01 de julho já o podem visitar.

Proprietário também de um restaurante e unidade hoteleira, o empresário vê maiores dificuldades para recuperar nestes setores.

No total do grupo com mais de 100 empregados no concelho, Rui Machado conseguiu poupar os postos de trabalho e até tem contratado em outros setores, como na limpeza, devido às novas regras de higiene e segurança.

Local de passagem para degustar a gastronomia da região e um sítio frequentado habitualmente por espanhóis, o restaurante “A Talha” está de portas abertas, mas ainda muito longe do movimento pré-covid-19.

“De um espaço para 170 pessoas, retirámos 15 mesas e cerca de 100 cadeiras, podemos receber 67 pessoas e já seria bom se diariamente servíssemos metade”, conta João Monteiro, que aguarda o regresso dos habituais clientes espanhóis.

“Temos muitos clientes de Verín que mesmo durante a semana de trabalho vêm cá comer e voltam a Espanha. Muitos têm ligado para perceber se já reabrimos e nós estamos a aguardar por eles”, revela.

João Monteiro vê mesmo a reabertura das fronteiras como a “tábua de salvação” para a quebra no negócio.

Também a autarquia flaviense aguarda a fim da ‘barreira’ entre Chaves e Verín, que pôs até em ‘pausa’ a eurocidade.

Para o vice-presidente da Câmara de Chaves, Francisco Melo, será positivo poder, a partir de quarta-feira, “retomar os laços ancestrais que unem os dois povos”, bem como as relações económicas.

“As populações dão-se bem e são amigas, têm negócios e os comércios funcionam em contínuo”, explica.

Mas deixa também avisos para que haja “cuidados redobrados” e que sejam cumpridas “as normas de segurança e afastamento social”, para que não haja “recuos”.

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