EntrevistaSesimbra

‘A nossa atitude foi sempre a de resistir ao populismo’

A segunda parte da entrevista com Francisco Jesus, no balanço de um mandato, quando se aproximam novas eleições autárquicas.

Esta é a questão que se impõe: como foi o mandato em pandemia?

O executivo teve uma postura, e há que o dizer com toda a frontalidade, que foi transversal a todos os eleitos e a todas as forças políticas, de união para combater o grau de incerteza e até o medo que a situação do covid19 gerou.

Tivemos um período sem saber muito bem como agir, fosse na aquisição de material, na organização dos serviços e nas medidas a tomar, mas em tudo isso, existiu um grande sentido de responsabilidade, de compreensão e de grande elevação de todos os eleitos, das Juntas à Assembleia Municipal, e de todas as forças políticas.

Era feita uma avaliação quase diária, e todos estiveram envolvidos na discussão, e embora se pudesse discordar de alguma decisão ou medida do Governo ou do próprio município, houve a opção de todos de não politizar ou criar casos políticos com a pandemia.

Foi um período complicado, com decisões que tive de tomar quase ao minuto, em que muitas vezes só tinha tempo de enviar um email ou uma mensagem a dizer: «passa-se isto, a minha opinião é que se faça isto ou aquilo, o que acham», e sempre obtive compreensão de todos.

Ao nível das medidas nacionais, podemos discordar ou concordar com algumas, se podíamos confinar ou desconfinar mais, se as medidas para as actividades económicas foram ou não bem calibradas, todos nós temos a nossa opinião, mas também disso nenhum dos eleitos fez qualquer bandeira política.

Muitas vezes tivemos de nos substituir à Administração Central, mas sempre com um papel de partilha e parceria em função das orientações a nível nacional que recebíamos. Se foi preciso montar centros de testagem e ter voluntários com funcionários da Câmara Municipal a ajudar, assim foi feito; era preciso pessoal do Gabinete Municipal de Proteção Civil Municipal acompanhar os testes, estavam lá, e quero destacar o trabalho também feito por esta equipa.

Reuníamos centenas de vezes a Comissão Municipal de Proteção Civil durante este período, para decisões e ponderação técnica sobre questões como abrir ou encerrar praias e/ou a marginal, parques infantis, acessos, etc. e tudo foi ponderado de forma a que as decisões não tivessem apenas uma perspectiva política, do que seria a nossa visão enquanto eleitos da maioria, mas baseando-nos no entendimento desta equipa técnica que engloba forças de segurança, da Proteção Civil, Segurança Social, entre outras.

Mas posso dizer que a gestão da informação foi o mais difícil. Tínhamos uma informação contínua, mas também muita contrainformação, e quinzenalmente tínhamos alterações das decisões dos conselhos de ministros, depois também interpretar algumas decisões, não foi fácil.

E depois tivemos a questão da opinião pública entre o cidadão com algum excesso de zelo e medo, e o cidadão que entende que as regras não se lhe aplicam.

O medo foi também algo muito difícil com que tivemos de lidar, até ao nível dos serviços, porque as pessoas queriam proteger-se e às suas famílias.

O gabinete da presidência era a sala de emergência e de operações, onde também guardávamos os equipamentos de segurança, que tivemos de comprar a preços altamente especulativos. Foi um trabalho duro para conseguir obter esses equipamentos dos fornecedores, e tenho de dizer que houve uma grande articulação entre a Área Metropolitana de Lisboa, em que os 18 municípios se entreajudaram para a obtenção de equipamentos.

Nestes tenho de valorizar a Câmara Municipal de Cascais que tomou a decisão de mandar um avião buscar equipamentos à China, numa altura difícil e foi o que nos valeu para termos os EPI para poder distribuir aos serviços da linha da frente, IPSS, forças de segurança, e Centros de Saúde.

Mas mesmo assim tentámos não perder o norte ao nível do que estava previsto de investimentos, e não perdemos.

A nossa atitude foi resistir à popularidade e populismo. Não andámos a distribuir máscaras às pessoas, mas criámos programas específicos para garantir o acesso de todos a máscaras e outros equipamentos.

Sesimbra sofreu também bastante ao nível do turismo e hotelaria, mas mesmo assim em 2020 foi o que teve a menor quebra da AML, até porque como o confinamento ocorreu na altura do Verão, e o concelho tem muita oferta, levou a que as pessoas se concentrassem aqui.

Também não temos registo de encerramento definitivo dos micro serviços ligados ao turismo e restauração, ou de outras lojas, e os dados também apontam para que não se tivessem registado muitos casos de desemprego.

«Temos uma oposição combativa, mas existe um respeito mútuo de parte a parte»

Já referiu que houve uma boa relação entre os eleitos dos vários partidos durante a pandemia, e antes disso?

Aqui em Sesimbra, e não é apenas deste mandato, sempre tivemos uma grande elevação na discussão política. Há visões e estratégias diferenciadas de força política para força política.

Claro que nas redes sociais por vezes há excessos entre os partidários e apoiantes, que se exacerba sempre um pouco mais em altura de campanhas eleitorais.

Mas tenho de dizer que a ação, o debate e a expressão política se faz sempre com muita elevação. Claro que temos uma oposição combativa, mas onde existe um respeito mútuo de parte a parte, e em que o trabalho é feito sem roçar a boçalidade, e evidenciando as diferenças políticas, repito, com elevação, e acho que isso é muito salutar.

Conhecemo-nos uns aos outros e não me recordo de qualquer inimizade, ou perda de amizade, porque alguém é de uma força política diferente.

Creio falar pelas outras forças políticas quando digo que todos nos sentimos confortáveis com essa elevação, e isso revela também uma grande maturidade política no concelho.

Já aconteceu em Assembleia Municipal ou nas reuniões camarárias que a oposição detecte algum erro ou algum aspecto que tenha de ser rectificado, e não temos qualquer problema em o fazer. Não somos donos da verdade, também erramos e, sobretudo, aceitamos sugestões para melhorias.

Se temos uma visão estratégica ligada ao turismo, e há outros partidos que acham que ela é ‘excessivamente estratégica’ neste ponto, são diferenças estruturais que podem levar a ter de fazer opções no futuro.

Claro que também não é tudo tranquilo, e neste mandato tivemos um episódio mais triste, e que fraccionou um bocadinho esse grau de confiança, porque foi quebrado também o dever de confiança, de confidencialidade e dever de reserva a que todos os eleitos estão obrigados.

Foi algo que teve a ver mais com pessoas do que com esta relação institucional, por alguém que nem pertence à Assembleia Municipal, que colocou um documento interno de uma Comissão na imprensa, no Ministério Público.

A situação não teve qualquer desenvolvimento, e todos reconheceram que foi um episódio menos positivo da nossa história autárquica, mas causou algum mal-estar, até porque nós próprios temos o cuidado de ser frontais e de não esconder os problemas, mesmo os mais complexos.

Foi já anunciado como candidato da CDU às próximas eleições autárquicas, como encarou essa decisão da CDU?

Foi algo natural. A minha decisão pessoal foi mais difícil há quatro anos, não só porque era uma ‘herança pesada’, mas também porque tinha decidido fazer uma pausa para dar mais tempo à família.

No entanto tive de responder ao desejo do Augusto Pólvora, que já manifestara a intenção de que eu o seguisse na liderança da Câmara Municipal desde 2013, mas na altura não aceitei e ele até me dizia a brincar que ‘não queria era trabalhar com ele’; e depois o meu filho nasceu pouco antes do final do meu mandato na Junta de Freguesia, e isso também influenciou a minha decisão.

Antes das eleições de 2017, o Augusto insistiu imenso comigo até que aceitei. E nessa mesma noite ele encheu-me o email com todos os projectos e processos pendentes da Câmara Municipal, para me colocar a par de tudo o que se passava.

Nessa altura já estava numa fase adiantada da doença e creio que ficou aliviado por poder entregar nas mãos de alguém em que ele confiava toda a documentação.

Foi realmente uma herança muito pesada, porque sempre foi uma pessoa que deu tudo a Sesimbra, e recordo que a última vez que saiu de casa como autarca, foi para ir visitar as obras do Parque que agora tem o seu nome, na Maçã.

Agora a decisão foi mais fácil, até porque temos três grandes desafios à nossa frente: a saída desta pandemia e a retoma dos indicies de crescimento que o concelho de Sesimbra estava a ter, a um ritmo de quase dois dígitos, o que é muito bom, além de termos uma das mais baixas taxas de desemprego na AML embora com uma necessidade de formação profissional qualificada, sobretudo ao nível da hotelaria; terminar este ciclo de investimentos; e toda a projeção para o futuro que fazemos, em que estamos já a trabalhar nas potenciais candidaturas do Lisboa 2030, que infelizmente vai ser reduzido para metade e com uma taxa de financiamento de 40 por cento.

Também já fizemos um árduo trabalho, em dois ou três meses, preparando as candidaturas ao Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), na vertente da Habitação, com um investimento estimado na ordem dos vinte milhões de euros, a ser concretizado até Agosto de 2026.

Há um grande conjunto de trabalho que temos pela frente, de afirmação e emancipação do concelho de Sesimbra, e temos de continuar com este desafio aliciante.

Temos uma excelente equipa em todos os órgãos autárquicos e é com naturalidade que trabalhamos para Sesimbra.

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