Opinião

A felicidade somos nós

O imperativo ético e social de cuidar dos outros é corrente na nossa cultura desde há milhares de anos. Mas para cuidar dos outros temos de nos preparar, de cuidar de nós. Se não cuidarmos de nós não seremos capazes de cuidar dos outros.

Séculos antes de Cristo, o grande filósofo ateniense Sócrates criticava os seus conterrâneos por se preocuparem com fortuna, poder, prestígio sem se preocuparem com os outros. Sócrates tinha abandonado a fortuna e o poder politico para se ocupar dos outros. E fazia ver que ninguém podia ajudar capazmente os outros sem uma profunda preparação pessoal que deveria prolongar-se ao longo de todos os dias da vida.

Esta moral prolongou-se até ao cristianismo, em que foi formulada radicalmente no mandamento “ama os outros como a ti mesmo” (ou ,”faz aos outros o que gostarias que te fizessem”). Mas… como se pode cuidar do outro, amar o outro, se o próprio não se ama e não se cuida?

Este amor, este cuidado, exigem uma preparação prévia. O cristão tem de renascer, de ser novo, para poder aplicar os ensinamentos de Cristo. Seguir o exemplo de Cristo não é só ter fé e dizer que se tem amor. É praticar, agir. Quem ama o outro, exprime-se praticando o amor : dar de beber a quem tem sede, de comer a quem tem fome, visitar os abandonados, consolar os deprimidos. E através desta prática, aprofunda o seu amor e é capaz de mais cuidado. Amando, cuidando dos outros, era Cristo que via nos outros .

Nos primeiros tempos da Igreja de Cristo, em Jerusalém, os cristãos punham tudo em comum  e tudo partilhavam. As conversões ao cristianismo, nomeadamente em Roma, eram acompanhadas de libertação de escravos e de donativos. Um presbítero da Igreja, ao ser intimado para entregar os tesouros da Igreja, apresentou os pobres e abandonados como o tesouro da Igreja.

A partir daqui, a proteção a idosos, a doentes, a mulheres maltratadas, aos com fome, sem casa, passou a ser conduzida pela Igreja e pelos seus membros. Na Idade Média, conventos e Igrejas tinham normalmente associados refeitórios, albergues, enfermarias e escolas onde se dispensava aos necessitados um tratamento pelo menos equivalente à quele de que gozavam os padres e os monges.

Criou-se um circuito do dar, em que o próprio também era necessitado e devia dar aos outros pelo menos o mesmo que queria para si.

Estas considerações foram-me suscitadas por dois factos.

Primeiro, pelo excelente trabalho levado a cabo pelas Misericórdias na atual pandemia. Lembremo-nos que as Misericórdias foram o primeiro sistema independente e generalizado de assistência aos outros, desde fim do século XV.

Mas também pela auto-disciplina de tantos portugueses com os cuidados de saúde na pandemia. Quando vejo alguém de máscara na rua, penso que essa pessoa está a cuidar-se e a cuidar dos outros.


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