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A censura da Comissão de Jornalistas e o delito de opinião

“[António Abreu] ao afirmar que “qualquer português pode fazer jornalismo” mostra que confunde e despreza uma das razões fundamentais para existência do jornalismo nas sociedades democráticas que é na verdade o profissionalismo. Para além de ser uma clara afirmação populista e sensacionalista, equivale a dizer que qualquer português pode fazer medicina ou fazer advocacia” – excerto da deliberação, de 30 de Julho de 2021, da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ) referente ao indeferimento do meu pedido de Carteira de Equiparado a Jornalista.

Um Estado de Direito Democrático, de acordo com a definição no lexionário disponível no site oficial do Diário da República, implica “o permanente controlo/escrutínio do exercício do poder por cidadãos atentos e bem informados” e define que o “poder público está submetido a normas e procedimentos jurídicos (…) que permitem ao cidadão acompanhar e eventualmente contestar a legitimidade (…) das decisões tomadas pelas autoridades públicas”.

A Constituição da República Portuguesa (CRP) explicita no artigo 37.º que “todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informados, sem impedimentos nem discriminações” (nº. 1) e que “o exercício destes direitos não pode ser impedido ou limitado por qualquer tipo ou forma de censura” (nº. 2).

Um ano e meio após colocar a primeira acção em Tribunal, instaurei novo processo contra a CCPJ, pela recusa indevida e ilegal da minha Carteira de Equiparado a Jornalista, que me concederia os mesmos direitos e deveres de qualquer outro jornalista em Portugal.

Sem a Carteira Profissional não tenho direito de acesso às fontes de informação oficiais, não tenho direito ao acesso a locais públicos para fins jornalísticos, não tenho direito ao sigilo profissional, e não tenho direito a locais de acesso exclusivo à comunicação social, como por exemplo, a Assembleia da República ou conferências de imprensa do Governo, da DGS, do Infarmed ou de outras entidades oficiais e Órgãos de Soberania. Juntamente com estes direitos fundamentais que a Carteira Profissional protege, vários crimes que sejam cometidos contra mim não sofrem do agravamento da pena previsto no artigo 132.º do Código Penal, tal como o facto de não ter a Carteira impede-me de ser contratado por um órgão de comunicação social como jornalista.

A CCPJ ao recusar a minha Carteira Profissional está a violar os meus direitos de informar livremente bem como o direito do povo Português de ser informado, arrogando-se de poderes discricionários de mérito que a lei não lhe atribui, praticando efectivamente censura, limitando o pluralismo na imprensa e o confronto de diversas correntes de opinião

Actualmente, sou director do jornal online Notícias Viriato (NV) e sub-director do Diário do Distrito (DD), e como está definido no artigo 15.º do Estatuto do Jornalista, tenho direito à equiparação a jornalista, inexistindo e nunca tendo sido invocada qualquer outra incompatibilidade legal, pois não exerço funções de publicidade, marketing, relações públicas ou consultoria, não sou militar nem titular de órgão de soberania, e muito menos trabalho para partidos ou organizações políticas.

Sob a liderança da jornalista do Público Leonete Botelho, que, ao arrepio da lei, permitiu-se defender que o NV “não se pode classificar um jornal” ou “órgão de comunicação social”, a CCPJ afirmou, sem especificar uma única peça, que violei o Código Deontológico do Jornalista.

Na última deliberação ainda tem o desplante de alegar que não sou verdadeiramente sub-director do DD, e que o meu pedido de carteira “apenas serve para contornar a lei”, apesar de exercer funções na direcção desde Fevereiro de 2021, estar registado na ERC, e ter publicado várias notícias e moderado dezenas de debates, incluindo os referentes às autárquicas do distrito de Setúbal.

A CCPJ justificou a recusa da Carteira Profissional, de forma absolutamente ilegal, injusta e desadequada, alegando também que não faço jornalismo e que todo o trabalho que fiz até hoje foi “reprodução de informação não contextualizada e não trabalhada jornalísticamente”, apesar dos meus dois anos e meio a redigir notícias, realizar entrevistas, reportagens e investigações jornalísticas originais, exclusivas, e cumprindo o Código Deontológico do Jornalista, como é público e notório, seja nos meus trabalhos mais conhecidos, como a reportagem sobre a reprovação dos alunos de Famalicão, a notícia a denunciar o artigo 6.º da Carta dos Direitos Digitais, ou a filmagem do funeral do Tenente-Coronel Marcelino da Mata, seja nas centenas de notícias e dezenas de entrevistas que já produzi.

Estas alegações são sustentadas na citação de uma orwelliana e pidesca lista de vigilância do ISCTE de “monitorização de propaganda e desinformação nas redes sociais” e nas declarações do seu coordenador, o sociólogo Gustavo Cardoso, ex-assessor do Presidente Jorge Sampaio, que defende que o NV “partilha uma visão ideológica que o afasta de poder ser um órgão de comunicação social tal como é entendido pela maioria dos profissionais jornalistas, académicos e público em geral”.

A CCPJ, rematando as suas justificações para me recusar a Carteira, seleccionou e analisou várias frases que proferi numa entrevista, entre as quais:

– “eu espero que as pessoas sintam que é necessário este tipo de jornalismo, jornalismo do cidadão”;

– “Eu tenho o direito de ter os mesmos direitos e deveres que um jornalista”;

– “os meus colegas de jornais que constantemente fazem artigos difamatórios”;

– “este conceito de cidadão jornalista…isto não é sobre mim, é sobre qualquer português poder fazer jornalismo, que isso é que é liberdade de imprensa”.

A CCPJ, em avaliação e catalogação das minhas opiniões, da qual obviamente não tem cabimento legal, declarou, para além do excerto no início deste texto, que “toda esta narrativa choca com a interiorização dos princípios legais que norteiam a profissão (…) Estes excertos esclarecem a CCPJ sobre a conceção que o requerente tem do que é ser jornalista em tudo contrária (…) aos valores e princípios legais e éticos previstos e aceites pelos profissionais do jornalismo. Choca também com a história recente de uma profissão que se procurou dignificar, lutando para que existissem licenciaturas em jornalismo…”.

Ou seja, incorro em verdadeiro delito de opinião, por expressar aberta e publicamente entendimentos sobre a função do jornalista que não correspondem à ortodoxia corporativa, dominante e totalitária da CCPJ.

A Liberdade de Imprensa é necessariamente a liberdade do cidadão de ser informado e a liberdade do cidadão de informar, sem constrangimentos, impedimentos ou limitados por qualquer tipo ou forma de censura e por essa razão é que a CRP assegura no artigo 38.º: “o direito de fundação de jornais e de quaisquer outras publicações, independentemente de autorização administrativa, caução ou habilitação prévias.”.

Apesar de estar a escrever sobre o meu caso em detalhe, o que está em causa não são apenas os meus Direitos violados por uma Comissão usurpadora de poderes ilegítimos, mas sim as Liberdades de Expressão e de Imprensa, as Garantias instituídas na Lei e na Constituição, tal como o futuro do jornalismo independente em Portugal.

Caso a generalidade dos jornalistas cumprisse os pontos 2 e 3 do Código Deontológico a que está submetida, estes atentados às Liberdades Fundamentais não aconteceriam num alegado Estado de Direito Democrático: “O jornalista deve combater a censura (…) O jornalista deve lutar contra as restrições no acesso às fontes de informação e as tentativas de limitar a liberdade de expressão e o direito de informar. É obrigação do jornalista divulgar as ofensas a estes direitos.”

Nota: Este processo contra a CCPJ, tal como o anterior, foi possível devido à ajuda imprescindível de um advogado pro bono. Se puder e achar justo, por favor considere fazer um donativo para pagar as custas judiciais no valor de 615€: IBAN – PT50019300001050233602613 / MBWAY – 910372353

 

António Abreu, Sub-Director do Diário do Distrito


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